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sexta-feira, 15 de novembro de 2013

noturno



a noite agoniza
mistura-se
com os tons do dia

e da decisão pela angústia hoje errei...

mas são as emoções que me escolhem
quando vou parar
de trocar o dia pela noite?

é que do dia já tiram tanto
de dia aproprio-me da sensibilidade alheia

fujo todo para noite
nela
consigo aproveitar
até o que se descarta
dou outra poesia a toda melodia
rumino todas as saudades
salivo todas as vontades
e se não me curo ao menos vigio a ferida

agora no amanhecer
não escuto mais o que a música diz
como não me livrei nem absorvi a saudade
tenho que esperar outras noites

toda minha sensibilidade é forjada
a luz da lua


Luciano Lopes. 



sábado, 2 de novembro de 2013



a poesia goteja de uma torneira velha
a ternura represada em um dique
que reflete o Sol
as agruras escorrem até a altura dos joelhos
e respinga nos olhos
beijo o bico da torneira
dia a dia
- não há dique que um dia não transborde


Luciano Lopes



evasão



ao menos hoje
por algumas horas
deixa num intervalo
todas as agonias
todas as aflições
todas as procuras
suspensas
a existência
cala, o mundo um pouco

deixa-me descansar esse coração
inquieto
concede a essa alma
: conforto
que seja eu
na noite
com silêncio
e um riso maquinal

deixa-me ausente
o suor do meu rosto
a taça de vinho barato
o barulho do ventilador
como cadência
os suspiros
mantendo meu sangue morno
e essa sensação de que qualquer
mal entendido com a vida
não passa de teimosia minha


Luciano Lopes.


DANÇA



hoje
depois de tudo
dos risos soltos
dos carinhos afoitos
de tantas abundâncias
fico colhendo migalhas no chão
encerado
encerrados
aonde dançamos
tentando
tentados
com dedos gigantes
juntar uns pedaços
de tua pele escassa
ferindo a minha carne
dormente
meus olhos ardem
desentendidos ainda
dos olhos alheios


Luciano Lopes.


DEVANEIOS


DEVANEIOS

espio por detrás das venezianas

— as vistas acostumam-se tão fácil à luz artificial —

que o simples espreitar desprevenido

do que é reflexo da claridade

pela menina dos olhos

num dia de fuga

dos raios de sol

já é uma aventura

há um jardim que observo

— é tão meu!

qualquer dia insurjo-me

e vou

usucapir

suas flores


Luciano Lopes




a noite como uma implosão

deixou lembranças

em ruínas

tentei dar as costas

e ir embora

amanheci o dia

no mesmo lugar

com as mãos cheias

de todos os pedaços

que eu deixei sobreviver




Luciano Lopes



há tantos ruídos
contrapondo-se
aos meus silêncios
há tantas traves
impedindo meu choro
há uma morte
para cada verso

mas a vida é um cordel
que aceita o repente

há o verso que não quer
ser dito...
quer ser bradado!

- bendito seja o verso
que espanta para "os amanhãs"
a hora da última morte -


Luciano Lopes.


Urgência



então a gente combina assim
: eu e sua silhueta
a noite é um convite
o sabor que sinto
na minha boca é agridoce
o cheiro que sinto é amendoado
a lua é um holofote que ilumina
só os contornos apropriados
mais perfeito que isso
só se o eriço na entrega ao tato
fosse imediato


Luciano Lopes.



OUTONO



“devagarinho” as pessoas vão
deixando a gente
e como árvores
a cada doído
adeus
entorta-se mais um galho


Luciano Lopes


na garganta a dor contínua
na madrugada a temperatura
do arrepio
a alma nua, crua, forte e jovem sempre
eu e a noite
-posso sempre navegar até a lua
enganar a lentidão e a exatidão da razão
seguir de novo o coração bandido
no óbvio pode estar o grito de alívio


Luciano Lopes


AMIGOS



(para as mãos do afago e afeto dos meus amigos tão caros)

um inusitado sorriso
quase um descuido
do semblante
mas os olhos riram
décimos de segundo antes
a vida é mesmo um tobogã
que não é íngreme na medida
exata ou até mais ousada
para deixar que as emoções possam
comover-nos constantemente

vez em quando
sinto uma mão atrevida
e bem vinda
ajudando
que o vento passe
um pouco mais de brisa
sobre meu rosto
aliviando meus suores
de ansiedade
fechar os olhos um pouco
descansar dos placebos
e sentir um arrepio
só com os hormônios
apropriados...
ando aceitando mais
mãos amigas
tocando
meus sentidos


Luciano Lopes.


Às vezes, acho 
que o tempo da gente 
é pouco 
para tudo 
que queríamos 
ver mudar 
ao redor 
e dentro...


L.L.


sexta-feira, 1 de novembro de 2013

SINTOMÁTICO



minha ausência da janela

com o ranger das dobradiças

ando fugindo dela

hoje seu barulho

foi um acaso

: as tramelas descuidadas

vi o sol deixando o dia

tudo virou um borrão amarelo

dei as costas

ando mentindo até para

os encantamentos mais simples


Luciano Lopes


NOTURNO



se eu disser que tenho medo da noite
tenho que desfazer todos os meus tratos
quem faz suas escolhas à noite
entende bem como é difícil o acerto
sou um veterano do medo
foi dele e da noite aberta
que articulei o melhor
foi abraçando o dorso
ao cobertor e a insônia
até amanhecer
que fiz o nascer ou morrer
desejei a morte para mim sem dor
desfiz os amores em ensaios
ruminei a mágoa até a acidez
perdi o medo do medo de qualquer nudez
diluí ansiedade pela última vez com escoras
até a próxima noite...
dei um grito aos ouvintes que ignoravam
o silêncio a quem queria tanto que eu falasse

na luz do dia nem sempre é romper ou fechar pactos
não custa nada esperar um pouco menos de luz


Luciano Lopes.


PULSAÇÕES POR MINUTO



Há de ter alguma paixão
Não há sentido no pulsar
Sessenta
setenta vezes se não
for para dilatar meus olhos
Se não for fazer meus hormônios
correrem fora do compasso
Se o suor não me entregar
Há de pulsar quando menos espera
a cento e cinquenta e descuidar os músculos
da face
: sorriso
Há de doer na minha garganta
: vida
Há de acumular em segredo
que não nos suportaremos
Mas fomos feito um para o outro


Luciano Lopes.


AINDA ESTÁ NOS OLHOS



vem, vamos dançar a música
aonde você leu meus olhos
pela primeira vez
esqueça os anos
que se passam
por um instante
não tenho tantos
prodígios quantos
haviam em mim

mas se seus olhos
conseguirem manter
seu olhar
no meu
como da primeira vez
há neles ainda
uma vontade
que não me abandona
que confesso aqui

a posse que quero sua
a de fazer você sorrir
todas as vezes que seus olhos
não se desviarem dos meus


Luciano Lopes.


SAUDADES



Encontrei o anel
Que tu me deste
dava ciranda
dia desses
Era aliança
do amor para sempre

Se o anel não é de vidro
deixou de ser promessa
misturou-se as bijuterias
que comigo deixaste
que carimbo as página
que para ti ainda esqueço
embaixo da minha porta



Luciano Lopes




POR UM RISO



chega desse outono
não vou clamar temporalmente
digo de meu outono
Espero, contradizendo-me
um setembro de flores
que não vou clamar todas as cores
Espero, contradigo-me mais
um perfume que me arranque
esse suspiro engasgado
e um riso que exponha todas
as minhas linhas de expressões
tão contidas ultimamente


Luciano Lopes


SINA DO POETA


Eis que por ocasião do nascimento
desse poeta
Deus soprou não apenas vida em minha alma
não soprou só o viril desejo pelo sexo oposto
mas uma doce, terna, frágil
e apaixonada cisma
 pela a alma feminina

Desde então
não passei um dia de sossego
em suspiros e aflição
que nunca tomei como castigo
e sim boa dita
que passaria a vida escrevendo canções
ditando aos dedos
bendita vocês chamadas de sexo oposto
que discordo sexo oposto, para bem dizer-lhes
: metade
aonde vim pregar que sou também
: metade

Mas Deus
por vaidade
Olhou-me e disse:
- sucumbirá também às luas
Por isso essa mistura doidivanas de poeta e lobo
Do meu gosto pela dança
mas também a entrega ao ermo
que só se rende a metade que me completa
ou as noites de lua.



Luciano Lopes.